Por
Fabio Gomes - www.somdonorte.com.br.
Cabe
ao Estado (no sentido de ente público) apenas apoiar ou também
promover ações culturais? Este foi um dos temas que surgiram
durante o debate de abertura do Festival Quebramar, em Macapá, no
dia 10 de dezembro de 2012. Um dos debatedores observou que, no
Amapá, o governo estadual vem prioritariamente apoiando iniciativas
já existentes, sem criar novos eventos. A partir daí, a mesa
colocou o tema em discussão: que papel cabe ao Estado apoiar ou
promover ações culturais?
A
princípio, parece mais salutar que o Estado apenas apoie iniciativas
culturais que partam da sociedade. Isto acontece, por exemplo, com o
próprio Quebramar, organizado pelo Coletivo Palafita desde 2008, bem
como outros festivais, seja no Amapá, seja em Roraima ou em várias
outras unidades da Federação – bandas e produtores, organizados
ou não em coletivos, criam festivais que com o tempo recebem o apoio
público. Mas há casos em que a iniciativa estatal é indispensável.
Em setembro deste ano, por exemplo, foi realizada em Macapá a
primeira Feira de Livros do Estado do Amapá (FLAP). Apenas algumas
feiras de livro no Brasil são realizadas pela iniciativa privada,
justamente em locais onde há um mercado livreiro-editorial
consolidado – casos de São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre
(cuja feira chegou em novembro último à sua 58ª edição). Na
maioria dos Estados ou municípios, porém, ou o Estado toma a
iniciativa, ou um evento desta natureza não irá ocorrer.
Debate de abertura do Festival Quebramar 2012 (Macapá)
Bom,
você pode estar se perguntando: se o Estado pode apoiar iniciativas
culturais da sociedade, o que é bom, e produzir eventos que de outra
maneira jamais aconteceriam, o que é melhor ainda, qual o motivo de
discutirmos isto? O fato é que, associado ao apoio, há o perigo de
ocorrer o que o poeta Herbert Emanoel, do grupo poético Tatamirô,
chamou no debate citado na abertura deste texto de “tutela”, ou
seja, uma tentativa do Estado de interferir nas ações culturais por
ele financiadas (o que em outros tempos já foi chamado de “dirigismo
estatal”). A interferência viria no sentido de fazer com que
determinados temas fossem abordados, ou evitados. No Brasil um dos
casos mais emblemáticos em relação a isto é a oficialização dos
desfiles de Carnaval do Rio de Janeiro na década de 1930. Ao se
propor a financiar o desfile das escolas de samba cariocas, o governo
determinou que os sambas-enredo abordassem apenas temas relacionados
à História do Brasil, na tentativa de evitar que fossem levadas à
avenida críticas aos governantes de plantão.
Feira do Livro de Porto Alegre 2012
Embora
a tutela seja um risco potencial, ela nem sempre se configura. Ela
não aconteceu, por exemplo, na já citada primeira edição da FLAP,
conforme relatou no debate do dia 10 a poeta Carla Nobre,
organizadora do evento. Não só o governo não buscou interferir na
forma de utilização da verba destinada ao evento, como o próprio
governador se fez presente em todos os dias nos estandes da feira,
expressando assim tacitamente um respaldo ao que estava sendo feito.
Enfim,
até aqui estamos concluindo que o apoio do Estado é benéfico,
principalmente se não impuser tutela (risco que, embora sempre
possível, não parece ter muita força atualmente). Mas de que
maneira o Estado poderia, ou deveria, dar este apoio?
Hoje
podemos dizer que há basicamente dois modos de apoio estatal à
cultura: o financiamento direto e o incentivo. No modelo de
incentivo, o Estado a rigor apenas chancela o projeto – um parecer
oficial é emitido declarando o projeto idôneo e apto a receber
recursos, que o realizador deverá buscar junto à iniciativa privada
(sujeito, portanto, à avaliação do departamento de marketing das
empresas, que receberão isenção parcial de impostos em troca do
apoio).
1ª Feira de Livros do Estado do Amapá 2012
Já
no modelo de financiamento direto, também chamado de “mecenato”,
o Estado abre um edital para seleção de projetos; os aprovados
receberão o recurso diretamente do orçamento do órgão proponente.
Algumas vezes, o financiamento não atinge o total dos gastos do
projeto – é assim que funciona o Fumproarte, da Prefeitura de
Porto Alegre, que financia no máximo 80% do orçamento do projeto.
Mas convenhamos que é mais fácil o proponente conseguir 20% dos
recursos necessários junto à iniciativa privada do que 100%.
Mas
enfim, qual seria o melhor modelo? Teoricamente, o mecenato, sem
dúvida, afinal a aprovação no edital já traz embutida a garantia
da verba necessária para o projeto. Mas há um sério porém neste
quesito: não há uma periodicidade estabelecida para o lançamento
dos editais, e quando eles são abertos geralmente o prazo para
inscrição é geralmente curto. Já o incentivo a nível federal, a
chamada Lei Rouanet, mantém as inscrições abertas ao longo do ano
inteiro; todos os projetos inscritos num determinado período são
avaliados em intervalos regulares, e havendo a aprovação (ou seja,
a chancela estatal), há um prazo relativamente longo para os
proponentes buscar captar os recursos.
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